sábado, 29 de maio de 2010

Grilhões

Grilhões atados aos pés.
Asas de garças querendo
Levantar o vôo branco
Sobre mar de amargura

Borboleta negra
Pousada no
Coração de manteiga?

A dor verde escorre
Musgo e líquen
na face de folhas

Lancinante e aguda
nasce uma flor
na minha cabeça.
Despetalo e desmaio

Pitangas rubras

Impulsos de pedras polidas.
Lianas de saudades?
Descaminhos no labirinto de espelhos
Deslumbra labaredas de suspiros.
Vergonhas inconseqüentes de pitangas
Rubras, doces, escoando de azuis.
Vozes e cantigas coloridas, mudas,
Que o giro dos sonhos traduz.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Porões

Outro dia fiz uma visita. Conheci o local de trabalho de artesãos aprendizes. Fui descendo escadas um... dois... três... degraus... mais alguns... mais pra baixo... o cheiro do barro seco, da argila molhada entrando nas minhas narinas. Respiro um ar úmido. Ao redor peças esculpidas... uma moranga, um rosto, uma concha. No fundo uma saída para um pátio com árvores antigas, folhagens e um banco de jardim. De repente não estou mais ali. O porão é outro, muito antigo. Uma casa sobre ele. Subo as escadas e reconheço a casa da vó de fora. Assim nós a chamávamos para diferenciar da nossa avó Marieta que vizinhava conosco em Porto Alegre. A casa no bom estilo italiano ficava nos arredores de Barbosa, quer dizer, município de Carlos Barbosa. Ficava no alto, encravada em terreno irregular. Na frente uma sala ocupava toda a largura. A porta principal dava para o avarandado e enfim para o jardim. O terreno continuava acidentado de modo que depois do jardim subia-se uma ladeira e chegava-se então aos trilhos do trem. Sim, o trem passava por ali, dividindo ao meio as terras do meu avô. O trem passava todos os dias pela manhã e à noite. Para mim era uma festa. Ouvia-se o apito estridente da locomotiva e corriam todos para ver o trem. Abanávamos para passageiros desconhecidos que vez por outra retribuíam os acenos. Claro que isto acontecia quando as netas da cidade estavam lá, porque de resto o acontecimento era ordinário e ninguém se preocupava com ele. Um corredor, com quartos de ambos os lados, uma peça ampla com mesa comprida para refeições, cozinha separada e o porão. Ah! O misterioso porão. Não nos permitiam muito ir ao porão. No meio da noite ouvíamos muitos sons vindos de lá. Alguma coisa caía estrepitosamente. São os ratos! Mas tem rato no porão? Outras vezes tínhamos a nítida impressão de passos. Raposas! Raposas? Aquele porão da minha infância permaneceu para sempre nos meus porões, cheio de mistérios nunca muito bem esclarecidos. Retorno... Olho ao redor e aprecio os objetos de arte expostos nas bancadas. Todos me parecem misteriosos.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Fogo-fátuo

Eu canto a vida da Terra
passeios de saibro, groselheiras
o que é ser uma pessoa?
vida que foge por todos os cantos
rochedo, fogo-fátuo, clareira
entre sonho e fantasia
a realidade
Um dia terei desaparecido

domingo, 9 de maio de 2010

Os pretos e os brancos

No princípio era a Cor... o Caos coloria-se em uma exuberância de diferentes tons e nuances, emaranhando-se em um novelo até o momento em que as Cores começaram a separar-se, definir-se e fazer suas próprias criações. Alguns tons formaram uma imensa bola marrom que se transformou no atual conhecido planeta Terra. O verde e suas nuances cobriram então o solo do planeta. Ainda meio misturado com o azul formou os oceanos e todas as águas. Porém fora daquela imensa bola e ao seu redor a supremacia foi toda do azul. Um pouco mais claro aqui mais escuro acolá e surgia o Céu. O amarelo criou estrelas brilhantes que flutuaram na imensidão. Amarelou tanto que ficou dourado e então surgiu o Sol, a estrela que aqueceu e vivificou tudo com seus raios de luz. Sim, porque o amarelo foi quem deu a luz. Vermelhos, encarnados, escarlates e violáceos tingiram a aurora no instante em que o Sol surgia no horizonte da Terra. Houve um momento em que as Cores separaram-se e alinharam-se no Céu logo depois da chuva, para logo em seguida esmaecer e aos poucos retornar aos seus próprios lugares. Era o arco-íris, ainda como o conhecemos hoje. E, como que para celebrar a harmonia, cada uma das cores, tons e nuances teceram as flores. Quiseram então superar-se nas mais diversas e inusitadas formas coloridas que alegram a vida e a morte no planeta. Quando resolveram criar formas livres surgiram os animais, mas já um tanto cansadas esmeraram-se mais nas formas do que no colorido. São muitas as formas animais que habitam a Terra. A última criação das Cores foram os seres humanos. E por estarem assim, meio que entediadas, criaram o homem e a mulher de tamanhos e formas variáveis dentro de um mesmo padrão, porém sem cores: Uns brancos outros pretos, um pouco mais, um pouco menos, uns pardos, outros tendendo para o amarelo, nada muito significativo. Nenhum melhor que o outro, nem mais exuberante.

sábado, 8 de maio de 2010

Maria Mulher

Marias de todas as cores
Marias de todas as dores
Marias de todos amores
Marias sagrando a semente
Mulheres marias somente
Mulher fortaleza macia
Gestando a vida que cria

Paz na guerra

Bombardeio que cessa
a explosão que mata
Crianças de asas abertas
anjos famintos que pairam
no céu vermelho da guerra
a hera sobe silenciosa
grudada no muro de pedra
Zumbem moscas voejando
contra as vidraças da janela
torpor paz de momento